Cogumelo ganha espaço no prato, cultivo cresce no Brasil e empresa botucatuense se destaca
Demanda do produto avança no país impulsionada por veganos, vegetarianos e pela cozinha oriental
Ele é a estrela do estrogonofe. Mas não apenas nesse prato. Mudanças de hábitos alimentares têm impulsionado o consumo de cogumelos no país. Veganos, vegetarianos e amantes da cozinha oriental são os principais responsáveis por essa mudança.
Só entre 2015 e 2022, a importação do produto em conserva deu um salto de 70%, saindo de cerca de 7 mil toneladas para pouco mais de 12 mil toneladas, segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
Esse avanço nas importações indica que há oportunidade para o crescimento da produção por aqui, um movimento que já está em curso, segundo a Associação Nacional dos Produtores de Cogumelos (ANPC).
A organização atualmente trabalha na apuração dos dados de produção nacional, após um hiato no levantamento durante os anos da pandemia. Projeções iniciais apontam para a produção de até 14 mil toneladas este ano.
“Os produtores brasileiros estão investindo em variedade de espécies cultivadas, tecnologia de produção e vendas in natura. Tudo isso, associado à busca do consumidor por alimentos com baixo teor de gordura e colesterol e ricos em nutrientes, impulsiona o setor”, afirma Daniel Gomes, pesquisador da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA) e presidente da ANPC.
Ele aponta entre os fatores que elevam o consumo o aumento dos adeptos do veganismo e do vegetarianismo. Além disso, diz, muitos dos pratos da cozinha oriental levam variedades de fungos.
Segundo dados da APTA, em 1996, cada brasileiro consumia, em média, 30 gramas de cogumelo ao ano. Passadas mais de duas décadas, consumimos cinco vezes mais — Foto: Divulgação
“A gastronomia oriental também caiu no gosto dos brasileiros. Em São Paulo já temos mais restaurantes japoneses do que churrascarias”, afirma.
Segundo dados da APTA, em 1996, cada brasileiro consumia, em média, 30 gramas de cogumelo ao ano. Passadas mais de duas décadas, consumimos cinco vezes mais, cerca de 160 gramas.
Nessa busca para consolidar o consumo, que ainda é de nicho, produtores têm diversificado os tipos cultivados. O champignon ainda é o protagonista da produção nacional, mas já cede espaço a shiitake, shimeji, cogumelo do sol, portobello e juba de leão.
De pai para filhos
De olho no potencial desse mercado, os irmãos Frederico e Guilherme Eira produzem, juntos, entre 18 e 20 toneladas de shiitake por mês e investem em tecnologia de cultivo em sua empresa, a Fungibras, sediada em Botucatu (SP). Estão hoje entre os maiores produtores de cogumelos do país.
Agrônomos, eles entraram no ramo há 20 anos, ao lado do pai, o pesquisador Augusto Ferreira Eira, hoje já falecido, que foi professor e pesquisador na Unesp (Universidade Estadual Paulista) e teve um papel importante no desenvolvimento tecnológico do cultivo de cogumelos no Brasil.
Eles contam que numa parceria entre em Unesp e Fapesp, a partir do programa Pesquisa Inovativa na Pequena e Microempresa (Pipe), o pai desenvolveu um sistema inovador de esterilização para os substratos que são utilizados no cultivo do cogumelo, que impulsionou a produção. A novidade permitiu ganho em tempo e escala.
Fungibras produz entre 18 e 20 toneladas de shiitake por mês — Foto: Divulgação
“O preparo do substrato, composto à base de serragem e farelo de cereais que recebe o micélio dos cogumelos (filamento que dá sustentação ao fungo na terra), precisa passar por criteriosa esterilização, a fim evitar futura contaminação por outros fungos e bactérias, e é uma das etapas realizadas quando o processo de cultivo é feito em câmaras com cultivo climatizadas”, afirma Frederico Eira.
Segundo ele, o sistema desenvolvido pelo permitiu uma esterilização dinâmica, em substituição às tradicionais autoclaves, executando todas as operações necessárias: homogeneização, esterilização, resfriamento, inoculação e extrusão do substrato.
Os dois irmãos continuaram investindo e hoje contam com uma produção especializada e verticalizada, em uma empresa de 65 colaboradores.
“Produzimos desde as sementes, inoculação, produção, seleção e embalagem dos cogumelos para diferentes demandas e formatos, até a entrega”, comenta Eira.
Ainda que o cogumelo venha ganhando espaço no país, ele diz que o aumento de custos de produção e a queda do poder aquisitivo do consumidor brasileiro são desafios.
“A população tem culturalmente inserido mais os cogumelos na gastronomia, mas trata-se de um produto com maior valor agregado, o que impede um aumento mais rápido”, avalia.
Venda de sementes
O incremento da demanda também estimula outras atividades ligadas à produção de cogumelo no Brasil. Edison de Souza, de Suzano (SP), que até pouco tempo produzia até 2,5 toneladas de shimeji por mês, optou pela especialização em uma parte da cadeia produtiva. O carro-chefe do seu negócio atual são as sementes, produzidas a partir do micélio dos cogumelos.
Em laboratório, ele tem cerca de 160 espécies vivas de cogumelos, para reprodução. “Atualmente, as sementes mais vendidas são de shimeji branco, preto e salmão. Entre os nativos brasileiros, o Pleorotus albidus, que é do mesmo gênero do shimeji e shitake, tem saído bastante”, afirma.
As sementes produzidas por Souza são enviadas para todo o Brasil. Ele diz perceber uma diversificação nos pedidos nos últimos tempos.
“Após a pandemia, quando as pessoas passaram a cozinhar mais em casa, experimentar mais gastronomicamente, houve uma mudança de comportamento, sentida pelo mercado, que por sua vez, a repassa até mim”, afirma.
Segundo ele, os pedidos tradicionais por champignon Paris, champignon marrom (ou Portobello) e shitake seguem firmes. Mas nota-se aumento da busca por sajor-caju, juba de leão e orelha de pau (este, mais procurado para utilização em chás).
Fonte: Acontece Botucatu